terça-feira, 26 de agosto de 2008

Tristeza e memória.

"Ela, menina de três anos, sabia que a morte é onde mora a saudade."
Rubem Alves

Quem escreve,
Escreve por que tem medo.

Escrevo pois temo a morte;
Morte do ser,
Morte da alma,
Morte do momento.

Alguém próximo morreu hoje,
E assim desespera o homem;
Corre em luto,
Entra o corpo.
Aonde estará aquele sorriso?
Aonde estará aquela voz?
Quem dera um último abraço.

Não quis a morte
Conceder de volta o que era belo.
Agora,
Só resta o corpo.
Se foram os sorrisos, a voz, os beijos.

Agora ele escreve,
Para ouvir de novo um murmúrio,
Uma confidência.
Escreve para alcançar o toque,
A marca que não volta.

Lança-se em um mar de infinitos,
Se oferece em sacrifício.

Escrevo pois temo a morte,
Não a minha.
...

Escrevo para manter
As cores vivas em meu quadro.
Frágil quadro de lembranças.

Escrevo para manter-te viva.
Pra te viver mais um dia.
Pra te ver feliz, triste.
Pra manter-te humana em minha mente.

Escrevo por que temo.
Temo a perda,
Temo a morte.

08/08

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Fragmentos

As várias colagens
São retratos.
Realidade esquecida,
Fragmentos soltos de um outro
Jogados em um canto da mente.

As marcas falam ao ouvido,
Baixinho, como um amigo esquecido.
Isso e aquilo,
Partes em branco de um quadro;
Manchas que não podem ser apagadas,
Falta que não pode ser desfeita.

Na parede há trechos de textos diversos,
São vidas tão diferentes,
Impressas em um horizonte no fim de tarde.
Todo céu para explorar,
Mesmo assim, continuamos no chão.

Tudo o que não foi, certamente voltará.

08/08

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Vermelho inocente

Pela janela de um quarto alto,
O vento toca seu rosto, brinca com seu olhar curioso.
Seus cabelos dourados contam histórias
Dizem sobre beleza,
Falam sobre ela,
Expressiva, cuidadosa.
Ao final do dia,
Em uma tarde pretensiosa,
Assim conversam com ela
Os inocentes dias,
Leves, calmos, pacientes.
Ela escuta atenta,
Sempre desprevinida.
Todas as tardes ela é criança
Eternizada no silêncio.
Na força do não saber,
Ela é forte como os montes,
Frágil como as rosas;
Só então, larga de ser menina
E passa a ser mulher

08/08

sábado, 9 de agosto de 2008

A um grande amigo

"Caro amigo,
Algumas coisas continuam difíceis; ás vezes me pego cabisbaixo, silencioso, repassando algumas frustrações, falhas...
Olho o tempo passando e eu sempre corro para não perder... Perder o quê? Não sei, mas corro inutilmente. Ainda ouço as mesmas músicas, ainda refaço meus velhos passos, você sabe, eu não mudo facilmente. Ainda ignoro alguns conselhos, julgando saber. Tenho andado por aí, pensando sempre na queda eminente, na minha estúpida teimosia, na velha mania de perder o jogo antes da partida; pensando que talvez eu nunca mude. Amigo, mais que irmão, quantas vezes te contei pesadelos que me atordoavam a mente! Sempre foi fácil te falar das lágrimas que não derramei. Meu caro amigo, obrigado por sempre ter sido aquele que se sentou na beira do abismo comigo, e me convenceu a não pular. Obrigado porque eu sei que, se fosse preciso, você desceria até o mais profundo abismo da alma, só pra chorar comigo as dores que, de já tão profundas, caminham lado-a-lado comigo. E só bastaria um olhar, um sorriso para que tudo se tornasse muito mais fácil.
Para nós que pensávamos morrer tão cedo, tenho grandes notícias.
Digo que a caminhada ainda é longa. E se não for, não importa. Um só dia pode conter uma vida inteira, e isso já é o bastante."

08/08

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Prenúncio de dor e loucura.

Ele, o homem
Acorda com o ensurdecedor som do silêncio.
Paira entre a dúvida e as luzes que o seduzem.
Encontra a mentira no silêncio
E a súplica na voz dos malditos :
"Nos dê plenitude!", eles gritam.

Correm atrás do destino
Entre os gritos da ilusão
E o solo de cimento.
Loucura visceral que os move.

Ele, o homem,
Teima em um piano de bar vazio,
Matando-se aos poucos,
Chorando notas que tocam seus cabelos.

Eles querem, precisam.
A multidão caótica
Grita pelo subjetivo andar da alma,
Pelo vagaroso caminhar do vento.

Entre a realidade e a desilusão,
Ele continua em seu piano.
Como dói cada compasso humano.

Ilusão.
Bolhas de sabão industriais.
A razão das indeterminações.
Bem, mal, esquerda, direita,
Somos todos humanos animais.

O homem dói cada canção lenta,
Num bar vazio,
Entre os fantasmas humanos
Todos humilhados, sentados no chão.

Como dói cantar a realidade,
Bonita humilhação.

08/08